Só riqueza e ninguèm faz nada, eta brasil. em santa fé de minas em minas gerais. tem gás que abastece o brasil por 60 anos acredite se quiser.
O novo mapa do petróleo
SANTA FÉ DE MINAS, MG - No sertão das Minas Gerais,
a iminente chegada das companhias petrolíferas é vista como salvação por quem
vive sem infra-estrutura à beira do Velho Chico. Noventa por cento da população
rural da região não desfruta de energia elétrica – e pisa sobre a solução.
Enquanto os royalties pela exploração do combustível não chegam, a riqueza
evapora, servindo apenas aos fogareiros, improvisados até em garrafas de
refrigerante. "Compramos bujão, mas pouco. Os colegas que vêm aqui pescar não
precisam de fogão na época seca", conta Salvandir, sorridente, ao lembrar da
economia que faz com o dinheiro do gás de botijão.
É assim pelo menos desde 1940, quando o pai dele,
recém-chegado da Bahia, fincou os primeiros alicerces de madeira na vila da
pacata Santa Fé de Minas. O pescador convive com as emanações de gás desde
criança, sem alimentar expectativas de ver o município deslanchar graças à
dádiva da natureza. À beira do rio, o rastro de óleo, que compõe a paisagem há
décadas, também não cria ansiedade. "Aquilo ali deve ser petróleo, a Petrobras
andou cá vendo isso", conta, conformado com o que tem e sem noção do que pode
mudar na vida da região com a chegada das empresas.
Enquanto os moradores vivem no ritmo próprio dos
sertões, a Petrobras, a multinacional inglesa BG, a brasileira Geobras e o grupo
argentino Oil & MS não perdem tempo: demonstrando apetite inédito,
disputaram dezenas de concessões na região, durante o último leilão de áreas de
exploração de petróleo e gás da Agência Nacional do Petróleo (ANP). O
conhecimento do fênomeno natural e a semelhança com a formação geológica da
Rússia – o maior produtor de gás do mundo – fizeram da Bacia do São Francisco a
mais atraente de toda a história das rodadas de licitações. Das 43 concessões
oferecidas, 39 foram arrematadas. Isso porque só a parte mineira foi a leilão. O
Velho Chico ainda corta os estados de Bahia, Pernambuco, Alagoas e Sergipe.
Um estudo com sensores de tecnologia militar
instalados na aeronave de uma das empresas que arrematou áreas, a Geobras,
aponta para a existência de um trilhão de metros cúbicos de gás natural debaixo
da Bacia do São Francisco, combustível suficiente para abastecer o Brasil por 60
anos, considerando o consumo atual. A projeção é preliminar, sujeita a revisões
a partir de perfurações de poços e testes de viabilidade comercial. Mas foi
suficiente para convencer bancos estrangeiros a financiar a pequena empresa no
projeto de exploração de nove áreas da região, com R$ 114 milhões.
Além da corrida para atender ao aquecimento do
consumo de gás no país, a proximidade com os grandes mercados também empolga os
investidores. "Temos Belo Horizonte e, se sobrar, podemos levar o gás a São
Paulo", comemora o presidente da BG, Luiz Carlos Costamilan. Parceiro da BG em
seis áreas de exploração na bacia, o diretor de Exploração e Produção da
Petrobras, Guilherme Estrella, prefere esperar os testes de viabilidade
comercial antes de comemorar: "O que temos de concreto, por enquanto, é uma
curiosidade geológica".
Os efeitos dessa curiosidade geológica chegam aos
animais que daquela água bebem. Na Fazenda do Vale das Aroeiras, no município de
Buritizeiro, trabalhadores estranharam o gado que bebia água num dos cinco poços
da propriedade. "As vacas ficam empanzinadas quando bebem a água. Não levantam
de tão estufadas de gases", conta, às gargalhadas, Jullierme Alves, funcionário
da Prefeitura de Buritizeiro. Três mil cabeças de gado dividem o pasto da
fazenda. Foi uma explosão na Fazenda das Aroeiras que despertou de vez as
autoridades locais, em 1988. A partir daí, a Petrobras furou um poço no local e
confirmou a existência de gás natural subterrâneo. Desde então, as visitas de
estudiosos e empresas não pararam. Lá, é possível assistir a cenas dignas de
filmes repletos de efeitos especiais, como o fogo sobre as águas.
Larissa Ferreira, 7 anos, adora acompanhar o pai,
Juvercino (foto), ao "poço encantado" que exala bolhas. A facilidade de cozinhar
não é a mesma encontrada à beira do Rio Paracatu. No afluente do Velho Chico, o
gás é tanto que vaza continuamente. No poço de Juvercino, as bolhas aparecem,
desaparecem, retornam, se espalham... e a panela demora a esquentar.
Nas cidades de Buritizeiro, Pirapora, Brasilândia
de Minas, Ibiaí, entre outras no Norte do estado, o gás às vezes traz decepção.
"Furamos cinco poços e nenhum deu água", conta Juvercino, mais preocupado com a
alimentação do rebanho do que com as reservas de combustível sobre as quais
caminha diariamente.
"Eles têm muito segredo; tiraram lama preta e
saíram de perto da gente", queixa-se, por sua vez, o pescador Antônio José de
Oliveira, diante do silêncio da Petrobras sobre os estudos geológicos realizados
na região. A curiosidade não é de hoje. "Sabem das coisas e não contam. Ô gente
desconfiada demais, essa Petrobras!".
A Bacia do São Francisco tem o mesmo tipo de
formação geológica da Rússia, o maior produtor de gás do mundo. "Antes da Rússia
encontrar gás, imaginava-se que não havia reservas sob esse tipo de bacia, mas
os russos quebraram esse tabu", explica o geólogo Wilson Guerra, da Universidade
Federal de Ouro Preto. A semelhança leva especialistas a apostar que a região
pode realmente abrigar reservas comparáveis às da Bacia de Santos, o maior
achado (comprovado) até então no Brasil – 400 bilhões de metros cúbicos
estimados.
Gás injeta vida nova no
sertão
Em vez de castigar, a seca faz milagre em Remanso
do Fogo, vilarejo esquecido pelo tempo, a 500 quilômetros de Belo Horizonte.
Quando baixam as águas do Paracatu, afluente do São Francisco, as borbulhas na
superfície do rio se transformam em labaredas. De maio a setembro, as chamas
esquentam os alimentos de famílias como a do pescador Salvandir Barbosa dos
Santos. Oculto no subsolo mineiro, o gás natural, que confere aura mística à
região, está prestes a mudar a realidade de cerca de 1 milhão de habitantes dos
municípios debruçados na Bacia do São Francisco - uma das novas fronteiras da
indústria petrolífera, tema de série de reportagens que o Jornal do Brasil, a
Gazeta Mercantil e a InvestNews publicam a partir de hoje. Grandes e pequenas
empresas enveredam pelos sertões, levando na bagagem planos de transformar as
Gerais no maior pólo produtor nacional do combustível.
Poço no quintal rende até R$ 30
mil
SANTA FÉ DE MINAS, MG - O proprietário da terra
onde os poços são perfurados tem direito a receber de 0,5% a 1% da produção. Um
poço no quintal pode render de R$ 1 mil a R$ 30 mil por mês, aproximadamente.
Juvercino acredita que o patrão, se contemplado, repartirá a riqueza com os
empregados da fazenda. O mesmo sentimento tem o aposentado Libânio de Souza.
""Estamos esperando pros filhos de Deus olhar e entender que nós temos que viver
também"", diz o aposentado, que abriga mulher e sete filhos na casa improvisada
de galhos e plástico. A família só quer o básico. Vive a cinco quilômetros do
Rio São Francisco, mas sofre com a constante falta d"água. Mora em cima de uma
promissora bacia de gás natural, mas não tem luz. Sem encanamento, o jeito é
caminhar quilômetros para buscar água num córrego. Sem eletricidade, a saída é
comer carne de sol.
Lenilza Alves Paulino Leal não perdeu a esperança,
mas desconfia quando se fala em promessas de royalties. Ela acaba de mandar dois
dos quatro filhos para Natal (RN). Os jovens partiram porque a água não chegou,
depois de três anos de espera. Em 2002, a família inteira trocou a violência da
periferia de Brasília pela tranqüilidade de Buritizeiro. Lenilza se mostra
cética quanto às promessas das autoridades locais. O alívio da gente do sertão é
que, diferentemente do que ocorre na exploração em alto-mar, em que os
benefícios com os royalties dependem da competência de prefeituras e governos
estaduais, os donos da terra têm direito à participação direta. Modesta, mas
suficiente para lhes dar o básico. (S.L.) jb